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terça-feira, fevereiro 16, 2010

A "asfixia" democrática e o "plano" contra a liberdade

por MARIO SOARES
Novos líderes políticos não se arranjam na fábrica do Bordalo.
1. Alguma imprensa, escrita, falada e televisões, parece pensar que um Governo legitimado pelo voto popular pode cair por pressão da comunicação social, ou seja: pelo movimento de opinião pública que tenta desencadear, contra o primeiro-ministro, utilizando títulos sensacionalistas e distorções obsessivas de fugas ao segredo de justiça, que ninguém sabe como foram obtidas, até porque são ilegais. Ora não pode nem deve, salvo o devido respeito. Seria a subversão da própria democracia, que tanto prezamos.

Com uma única excepção: o cansaço, o enjoo político ou a depressão que tal campanha pudesse provocar no primeiro-ministro. O que já aconteceu no passado. Duas vezes, que me lembre: com António Guterres, enojado pelo "pântano"; e com Durão Barroso, quando resolveu "fugir" para Bruxelas, depois de ter prometido aos portugueses, pelas televisões, que ficava por ter compreendido o voto dos eleitores e se dispor a mudar as políticas…
Não parece ser o caso de José Sócrates, teremos de reconhecer. Nesse aspecto, tem sido um exemplo de determinação, de coragem e de resistência. Tem aguentado os ataques, por mais injuriosos que sejam, as insinuações mais graves e até as veladas ameaças.
Apetece, com isenção, perguntar: há provas contra ele? Se há, porque não as apresentam no lugar próprio - os tribunais - e esperam, sem mais acusações, pela decisão da justiça? Porque entendem dever antecipar-se, a quem de direito, promovendo sucessivos julgamentos na praça pública que, como se sabe, só servem para descredibilizar os que neles participam, claro, a justiça e, finalmente, mais tarde ou mais cedo, a comunicação social?
O exemplo do que se tem vindo a passar na Itália, nos últimos anos, é, nesse aspecto, paradigmático. Será que a imprensa, em sentido lato, os políticos e os comentadores - que utilizam as "fugas" para aparecer nas televisões - querem para o seu país uma deriva pseudodemocrática de tipo berlusconiana?
As teorias da "asfixia" democrática, inventada por uma líder partidária, e do "plano" para amordaçar a liberdade de imprensa, havemos de convir que não fazem sentido. Por isso, não convencem os cidadãos comuns, por maiores que sejam as manchetes dos jornais, depois repetidas, comentadas e ampliadas pelas televisões.
O povo português viveu 48 longos anos sem liberdade, sujeito a uma censura rígida - e a uma repressão política e social cruel - para se deixar agora enganar. Mesmo as gerações que surgiram já depois da Revolução dos Cravos. Porque estas conhecem a história e conservam a memória que existe em quase todas as famílias, do que foram esses ominosos tempos.
Alguns anónimos bloguistas promoveram uma manifestação, em frente da Assembleia da República, para protestar contra o Governo Sócrates a pretexto da "asfixia democrática". Foi um flop! Sabem quantos manifestantes compareceram? Pouco mais de cinquenta, contando com os "mirones"… Os jornais e rádios, que anunciaram a manifestação, tiveram o bom senso de não a comentar. Fizeram bem. Poucos portugueses acreditaram na veracidade da "asfixia". Todos os dias lêem os jornais, ouvem as rádios e vêem as televisões. Que diabo?! Está em perigo a liberdade de imprensa? A última sondagem, publicada no Expresso, comprova a falsidade da acusação, dado que o primeiro- -ministro continua a subir nas sondagens, mais dois pontos, bem como o PS. A vitimização da sua figura é tão excessiva que só pode ser desfavorável a quem a faz… Como tem sucedido!
De resto, o partido que apoia o Governo - o PS - é bem conhecido do povo português, que sempre votou nele em todas as eleições, desde que há democracia, mesmo nos momentos em que as circunstâncias lhe eram mais desfavoráveis. Como nas últimas eleições legislativas e autárquicas voltou a acontecer, mais uma vez, contra as previsões de alguns. Não se pense que um partido, com a tradição do PS, possa ser comido em talhadas pela esquerda radical… Tentativas passadas bem o demonstraram.
Acrescente-se que o PS foi sempre - e continua a ser - o Partido da Liberdade. Antes e depois da Revolução. Alguém se esquece do PREC e do caso República, com o seu valente director, Raul Rego, sequestrado, à janela do seu jornal, a saudar a multidão, que o queria libertar? O PS tem uma memória que os portugueses não esquecem, mesmo quando, por uma ou outra razão, se zangam com ele. Não será agora que aqueles que o quiseram calar - ou se mantiveram num silêncio cúmplice - durante o PREC, e o atacam de novo, coligados aliás com a direita, irão consegui-lo.
O PS sempre foi - e será - um partido defensor das liberdades políticas. São os seus genes e a sua filosofia de base. Bem como a defesa dos mais desfavorecidos, da segurança social, do serviço nacional de saúde, criado por António Arnaut e por Mário Mendes, do desenvolvimento sustentado, da defesa dos direitos humanos, do Estado de direito e, consequentemente, da independência da justiça. Talvez por reconhecerem isso, em consciência, é que algumas vozes adversárias se têm erguido com a intenção de dividir o PS procurando separá-lo do seu secretário-geral, José Sócrates. Dizem que o PS é razoável, até pode governar em minoria relativa, o mau é Sócrates, o inimigo a abater. Pretendem, assim, criar, de fora para dentro, uma fronda no PS, contra o seu líder.
Tarefa impossível. Esquecem que o primeiro-ministro foi relegitimado há pouco tempo pelo eleitorado. E que José Sócrates, foi também relegitimado, pelos militantes do PS, no último congresso, que o reelegeu secretário-geral, por grande maioria. Não creio que haja militantes do PS, neste momento nacional tão crítico, disponíveis para se lançar numa tal aventura…
2. A crise europeia. De novo. Pondere-se, caramba, nos ensinamentos da situação grega. A União Europeia está a sofrer o primeiro ataque, da sua história, ao euro. As suas fragilidades começam a estar à vista. As bolsas europeias voltaram a entrar em perigosa turbulência. Van Rompuy saiu do seu silêncio e elaborou um plano, com a Senhora Merkel e o Presidente Sarkozy, para salvar a Grécia e também o euro. Marcou pontos, reconheço. Alguns técnicos reclamam a criação de um Fundo Monetário Europeu.
Enquanto isso, Portugal, em vez de reflectir no que se passa na sua terra - como resolver a crise e a ultrapassar - passa semanas a discutir uma crise política artificial. Com a intenção de alguns de a agravar a todo o preço. Ignorando soberanamente as dificuldades que aí vêm e como as combater. É de loucos!
3. Não é fácil derrubar um Governo legítimo. Sobretudo em democracia, no Parlamento, porque a direita parece não querer arriscar a apresentação de uma moção de censura. Já uma vez foi tentada, com más recordações para todos. E fora do Parlamento, então, é impossível. Mormente num momento de crise económico-financeira aguda e importada, com o maior partido da oposição dividido, paralisado e em vésperas de congresso. Não se prevendo de antemão quem será o novo líder e temendo-se que o congresso possa tornar-se num combate fratricida, em que avultam as ambições pessoais e escasseiam as ideias quanto ao futuro. Ainda por cima, a menos de um ano de eleições presidenciais, complexas. Pergunto: A quem convém, num tal contexto, derrubar o Governo e provocar novas eleições? Sejamos francos. Quando o Governo, uma vez derrubado, por imperativo constitucional, no quadro parlamentar actual, teria de ficar, provavelmente, em gestão, até à realização de novas eleições? Aos Partidos, com certeza, não, tanto aos da direita como da esquerda, incluindo o PS. Ao Presidente da República, ainda menos, por todas as razões. E para os empresários, o mundo do trabalho, os desempregados, para todos, seria uma verdadeira catástrofe. A abertura para o caos, por tempo indeterminado. Não deve este panorama, tão sério e grave, ser tomado em conta? Num momento em que a União Europeia segue, com tanta atenção, o nosso percurso político, económico e social, com o exemplo da Grécia sempre presente?
É o que explica, de resto, que depois de sessões do Parlamento tão inflamadas e agressivas - onde a irresponsabilidade parece ter sido a regra - os partidos da direita tenham viabilizado, na generalidade, o Orçamento e os da esquerda - se os entendi bem - tenham suspirado de alívio, depois de engolir o enorme sapo de apoiar as pretensões da Madeira…
É certo que se tem visto de tudo, por mais inconsistente que seja. Não assistimos à diatribe, contra o Governo português, feita no Parlamento Europeu, por um deputado português, com ambições a líder partidário e, imagine-se, a primeiro-ministro?
O eleitorado está farto de perceber que as eleições, neste momento, não aproveitariam a ninguém. O Programa de Estabilidade e Crescimento, até 2013, ainda nem sequer é conhecido. Não há alternativas credíveis ao Governo PS. Há muitos que fazem diagnósticos, alguns extremamente pessimistas, mas poucos que indiquem as terapêuticas possíveis e que tenham a coragem de meter a mão na massa e, em sentido figurado, oferecer o peito às balas.
Aliás, novos líderes políticos demoram tempo a aparecer. Não se arranjam, já feitos, na antiga fábrica do Bordalo, nas Caldas da Rainha. Já o diziam alguns políticos sensatos do liberalismo, em que se viveram também tempos difíceis…
DN, Lisboa

3 comentários:

  1. José Ângelo Gonçalves de Paulos17 de fevereiro de 2010 às 10:34

    A "asfixia democrática" se existe é na Madeira. Há uns bonequinhos na pag 2 no jornal pago por todos nós e que todos os dias achincalha toda gente que não esteja de acordo com o "Vasco da Gama" madeirense dos tempos actuais. Aqui, sim! Há uma asfixia. Agora, considerar bom jornalismo ao tal telejornal das 6ªs feiras de uma tal Manela (moura) Guedes, a qual em vez de transmitir a noticia comentava-a e gozava com gargalhadas em assuntos sérios. Ou esse tal sr Crespo. Houve e há bons jornalistas em Portugal Agora não me digam que os únicos são o casal Moniz e Sr Crespo. Quer eles queram, quer não o governo foi eleito mesmo em minoria, por conseguinte, tem o direito de governar. E tal como diz, para mim, o maior político português, Mário Soares, as alternativas são muito poucas para não dizer nulas. A situação em que o País se encontra não admite brincar às eleições.

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  2. Grande texto,
    Este homem de grande bagagem intelectual toca nas feridas mais perigosas da nossa actual sociedade.
    O poder dos média nunca foi tão forte, o extremismo sectarista jornalístico põe em causa tudo e mais alguma coisa, caso não esteja de acordo, e imagine-se tentam que o país seja governado consoante as suas primeiras páginas.
    Arrisco-me a dizer que neste momento grande parte dos média em Portugal apenas faz mal ao País e deveriam repensar qual é a sua verdadeira vocação.
    Porque sim, porque existe também corrupção no meio jornalístico, só que essa nunca é investigado...
    Parabéns á autora do blogue por lançar estes temas para discussão

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  3. Ora como foi o pacheco pereira que recomeçou ,cá estou eu a seguir-lhe os passinhos:-

    esta coisa de se falar na claustrofobia ás vezes indica que é melhor ficar calado e quedo.: http://bit.ly/aCwzCv

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