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domingo, dezembro 20, 2009

Não parecia ser Dezembro


Não parecia ser Dezembro. 
O sol mais que aquecia, queimava, e o povo ladainhando queixava-se das securas.

Mas em tudo era Dezembro; as limpezas, o jeito activo das gentes, aconchava-se o preço dos recos, mira-se o galo prá canja da Ceia, as teias de aranha urdidas em noites longas desaparecem, contam-se os "sapatinhos" para o ornamento dos altares, enfim, é a Festa.


Nos sótãos aneiros buscam-se as imagens da lapinha, os troncos e socas velhas, os papéis pintados. Branqueia-se o vestidinho do Menino, desenceram-se castiçais; o trigo demolhado cai nos minúsculos cântaros em sítios escusos e escuros, mais germinativos.

Eiras fora, chega-se terra à novidade pedindo aos céus o amadurecimento. A semilha nova não pode faltar dia de Festa e p'lo Ano Novo!


Em cada paróquia inventam-se ideias para o Presépio onde tudo será diferente menos as imagens. Ensaiam-se as romagens ou romarias para a noite de Natal. Lembrar os da terra, os emigrantes, os que aflitos prometeram, tudo é medido à sílaba, metricamente, num compasso sempre igual, entremeado de um coro demasiado longo, castigador por repetitivo, mas entregue de coração e garganta à solenidade.


Os "Meninos" surgem, num sorriso eterno, cândido, purificador, apaziguante de ódios, braços abertos, dedos de paz, pés assentes em tronos. É preciso repor alvas vestes cintadas. Uns, mais pudicamente vestidos que outros.

Melhor ou pior todos acreditam que o Natal é a Esperança, o tempo de solidariedade, a vez de todos e cada um, a Igualdade.
A geada da noite, o sereno, lembram Dezembro como as gambiarras lembram e iluminam, da casa para a rua, o caminho para as Missas do Parto. 
Manhã cedo, noite ainda, o grito lancinante da morte estremece os chiqueiros. De pronto avança o sopro do maçarico, o copo de vinho, o sangue aparado e depois frito na frigideira, e o bom dia de até logo que um novo porco os espera. É assim a "matada" do porco. Depois, escorridas as carnes, é salgar e avinhar o dente da época.


Dias Santos, amassa-se o pão de vésperas, varrem-se fornos, sacode-se a novidade do traje e, comidos e bebidos, corre-se à Missa em noite de Amor.

Acotovelado - não há faltosos nem pecadores - o povo sustém a curiosidade da romagem. E surgem oferendas, ramos forrados a notas grandes, seiras de produtos da terra, aguardentes, mel, vinhos, frutos escolhidos, tudo do bom e do melhor em honra do Menino. Toca o acordeão, a viola, cantam pastores e romeiros e, passo a passo, avançam para o altar. Fiéis filam-se com envelopes (uns de avião outros não), para o "Menino" que é dado a beijar na Imagem da Pobreza, da Humildade e Despojamento.


No regresso a casa todos comentam.

E os mais pobres, os mais humildes e os mais sós, enxugam os olhos no sorriso do Menino pintado, róseo, que dos Céus os convida.


Maria Teresa Góis

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