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terça-feira, setembro 22, 2009

Aprendendo com BRECHT

Quase tudo à nossa volta, veiculado pela ideologia dominante através da televisão, da rádio, dos jornais, da publicidade, do ensino, da cultura, das artes, da religião – ainda mais, apoiando-se em hábitos de um pesado lastro atávico de séculos de submissão social e política aos poderosos e às suas estruturas de um Estado construído para estar ao serviço das classes exploradoras -, quase tudo, no nosso dia-a-dia, nos induz a aceitar como verdadeiras, e únicas, e inevitáveis, e boas, as práticas dos governos de turno ao serviço ao capital. Visando obter a nossa resignação, a nossa aceitação das desigualdades, das humilhações, num exercício que nos conduza à desistência e à omissão da nossa própria vontade, confrontando-nos com mil formas enganosas para nos “cegar” a visão das realidades, para nos mascarar e ocultar as gritantes realidades da exploração e desta injusta e desumana organização das sociedades capitalistas.
As derrotas sofridas, no final do século passado, pelas nações europeias e asiáticas que intentavam a construção de sociedades socialistas, vencidas pela ofensiva exterior do imperialismo e pelas criminosas deserções e traições internas dos seus dirigentes, agravaram o quadro mundial no qual se trava a incessante luta de classes, originando acrescidas dificuldades na conquista de uma nova consciência social por parte de trabalhadores e povos.

Aos políticos do capitalismo, em particular aos dirigentes sindicais e sociais corruptos – nos sentidos político, material, moral – o capital atribui o sujo papel do permanente e demagógico fingimento de se fazerem passar por pessoas como nós, aparentando estarem preocupados com os nossos problemas, fingindo toda a hora e cada minuto que vão agir em defesa dos nossos direitos, empenhados em resolverem, por nós, as nossas dificuldades. Eles vão “questionar”, eles vão “reivindicar”, eles vão “lutar”, eles vão “argumentar”, eles vão”negociar”, eles vão fazer “todos os possíveis” para “tentarem” obter para nós – e, atenção, por nós! – aquilo que já conseguimos vislumbrar que é justo e de direito nosso.

Eles são todos os oportunistas, rasteiros ou emproados, de condição social modesta, média ou superior, em mangas de camisa ou engravatados, sem os quais passaríamos muito melhor. Uns são indivíduos populares, com baixas habilitações de ensino, outros são intelectuais, doutorados e com teses publicadas. Uns são dirigentes e chefias locais, outros são administradores e ministros. Mas todos, sem excepção, possuem duas características que claramente os diferencia de nós, dos trabalhadores e cidadãos comuns, a saber: a) todos venderam a consciência e a alma aos patrões, em muitos casos “por um prato de lentilhas” (alguns, por algo mais); b) todos se dizem muito nossos amigos, propondo-nos constantemente que fiquemos calados e quietos, pois assim eles farão por nós ”tudo o que a nós diz respeito!”

Vivemos estas semanas, mais uma vez, uma fase da vida dos portugueses na qual muita dessa gentalha vai esbracejar, garantir, vociferar, pedir, apelar, prometer, chantagear, jurar, implorar, enfim, vão de novo querer vender-nos “gato por lebre”, anunciando que não há melhor preço no mercado que o deles.

Deixe-mo-los faladrar à vontade, como democratas sinceros e verdadeiros que somos. Mas aos nossos camaradas de trabalho, ao nosso povo, afirmemos alto e bom som que, todos juntos na luta, devemos rejeitar com firmeza o “remendo” que nos oferecem. Nós não aceitamos remendos, ainda por cima “amarelos”, fingidos e esgarçados; queremos para o nosso povo o “casaco”, limpo e inteiro, que há muito nos devem e merecemos! O “Casaco” que Abril já nos permitiu vislumbrar no horizonte e que nos foi miseravelmente roubado!

Canção do Remendo e do Casaco
Sempre que a nosso casaco se rasga
Vocês vêm correndo dizer: assim não pode ser
Isso vai acabar, custe a que custar!
Cheios de fé vão aos senhores
Enquanto nós, cheios de frio, aguardamos.
E ao voltar, sempre triunfantes
Nos mostram o que por nós conquistam:
Um pequeno remendo.
Ótimo, eis o remendo
Mas onde está
O nosso casaco?
Sempre que nós gritamos de fome
Vocês vêm correndo dizer: Isso não vai continuar
É preciso ajudá-los, custe a que custar!
E cheios de ardor vão aos senhores
Enquanto nós, com ardor no estômago, esperamos.
E ao voltar, sempre triunfantes
Exibem a grande conquista:
Um pedacinho de pão.
Que bom, este é o pedaço de pão
Mas onde está
O pão?
Não precisamos só do remendo
Precisamos o casaco inteiro.
Não precisamos de pedaços de pão
Precisamos de pão verdadeiro.
Não precisamos só do emprego
Toda a fábrica precisamos.
E mais a carvão
E mais as minas
O povo no poder.
É disso que precisamos.
Que têm vocês
A nos dar?

Bertold Brecht

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